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By:
- Daniel Andrade Pinto
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- Tags: ADI 4395, adquirente de produção rural, funrural, Funrural Sub-rogação, inconstitucionalidade funrural, inconstitucionalidade sub-rogação, responsabilidade tributária, sub-rogação
STF JULGA FUNRURAL E SUB-ROGAÇÃO NA ADI 4395
09/12/2022: STF forma maioria para afastar sub-rogação do Funrural
O Ministro Dias Toffoli do STF colocou um ponto final em uma antiga demanda do setor rural e acabou por afastar a obrigação de retenção, a sub-rogação e as cobranças da Receita Federal sobre as agroindústrias referente à contribuição Funrural devida por empregadores rurais pessoa física. A decisão tem aplicação para todos no país.
O julgamento da ADI 4395-DF teve início em 2020 e o placar de votação na época ficou em 5 a 5. Agora, com o último voto, o placar virou e o resultado é 6 a 5 para os contribuintes.
O dispositivo declarado inconstitucional é o artigo 30 inciso IV da Lei 8.212 de 1991, com redação fornecida até a presente data pela Lei 9.528 de 1997.
O resultado do julgamento ainda não foi publicado no sistema do STF e, por isso, não há até agora a estipulação da tese. É que o julgamento está sendo realizado pelo plenário virtual do STF. Todos os Ministros já votaram. Mas, neste formato virtual, o processo pode ficar “em aberto” para receber votos por um período de 8 dias e no caso da ADI 4.395-DF o período é de 09/12/2022 a 16/12/2022. Portanto, é possível uma mudança de votos no período.
Uma vez encerrado o julgamento em 16/12/2022, recomenda-se, antes de interromper a retenção ou parcelamentos ativos, aguardar a publicação do resultado pelo plenário do STF e, por cautela, prevenção e segurança, enquanto não ocorre a publicação do acórdão do STF em definitivo, ajuizar um mandado de segurança com pedido de liminar.
Vale lembrar que é esperado que o STF module os efeitos da decisão, isto é, que a aplique apenas para fatos jurídicos ou compras de produção rural posteriores à data da finalização do julgamento em 16/12/2022 ou ainda estabelecer um prazo para a União Federal providenciar uma nova lei. Mas a modulação não deve prejudicar aqueles que têm ações judiciais em curso.
A nulidade da obrigação de retenção abre espaço para pedidos de restituição para quem não fez a retenção e destaques e pagou ou parcelou o tributo indevidamente.
Leia-se aqui os votos proferidos:
22/05/2020: Início do julgamento
O STF iniciou o julgamento da ADI 4.395 proposta pela Abrafrigo no dia 22/05/2020.
A matéria em debate é a constitucionalidade das regras jurídicas da contribuição social do empregador rural pessoa natural (Funrural) e da imposição de responsabilidade tributária por sub-rogação às agroindústrias compradoras de produção rural.
Várias associações e sindicatos participaram como amicus curiae.
A AFRIG, uma das amici curiae, foi representada pelo escritório Andrade Pinto Advocacia Tributária e apresentou memoriais para explicar que existem, em resumo, duas formas de se posicionar em relação à matéria da responsabilidade tributária por sub-rogação.
A primeira delas leva em conta a repercussão econômica do fenômeno da retenção, pressupondo que o retentor nunca arca com o ônus tributário da obrigação, salvo se descumprir seu dever legal de retenção, o que é considerado uma obrigação acessória e instrumental.
A segunda forma de se posicionar parte de uma análise jurídico-normativa e pressupõe que a “regra da sub-rogação” faz surgir uma nova obrigação tributária em que ocorre a exclusiva substituição do contribuinte pela figura do sujeito passivo responsável, o que vincula o patrimônio de terceiros.
Defendeu-se que a sub-rogação requer lei expressa, de forma paralela à hipótese de incidência do tributo (válida), em harmonia com o sistema constitucional posto à época, o qual apenas permitia a tributação do faturamento e não da receita bruta: se elementos da hipótese de incidência do tributo são nulos, a regra da sub-rogação fica contaminada.
Recordou-se, entre outros temas, que, desde a ADI 2, o STF tem declarado que “o vício da inconstitucionalidade é congênito à lei e há de ser apurado em face da Constituição vigente ao tempo de sua elaboração” e que há uma distinção entre os casos da ADI 4.395-DF e do RE 718.874-RS, bem como da importância do fato superveniente da Resolução 15 de 2017 do Senado Federal.
No dia 28/05/2020, último dia de julgamento do caso, o placar de votação ficou em 5 a 5. De um lado, a favor da constitucionalidade do Funrural e da sub-rogação ficaram os Ministros Gilmar Mendes, Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia, Luiz Fux e Roberto Barroso. Do outro, a favor dos contribuintes ou produtores rurais, dos frigoríficos e dos laticínios, e das outras empresas rurais, para impedir a cobrança do tributo, votaram os Ministros Edson Fachin e Marco Aurélio, que foram acompanhados por Rosa Weber, Ricardo Lewandowiski e Celso de Mello.
O Min. Dias Toffoli, Presidente do STF, não se manifestou no julgamento por recente afastamento ou licença médica para realização de uma cirurgia, conforme notícias divulgadas.
Por isso, não se sabia, até aquele momento, se seria aplicada a regra prevista na nova Resolução 642/2019, artigo 2º, § 3º, que diz: “Considerar-se-á que acompanhou o relator o ministro que não se pronunciar no prazo (…)”. É que no caso de ADI não há possibilidade de aplicar a referida regra ou o benefício do empate para os contribuintes. Em ADI, é o voto do Presidente do STF que define o resultado. Por isso temos 11 Ministros na Corte (STF-RI, art. 173). Nos telefones do STF recomendou-se que se aguardasse a publicação do resultado do julgamento.
De rigor, esta deve ser a última chance de resolver o chamado “passivo bilionário do Funrural”. O voto divergente do Min. Dias Toffoli pode pôr fim a uma demanda antiga do setor rural que tem gerado inúmeros problemas para os produtores e adquirentes.
Entretanto, o Ministro e atual Presidente do STF votou pela constitucionalidade do tributo em 2017. Mas na ADI em referência a matéria em discussão leva em conta também a questão da sub-rogação. Por isso, há uma chance do Min. Dias Toffoli declarar a inconstitucionalidade da regra que impõe responsabilidade tributária aos adquirentes de produção rural.
O Min. Edson Fachin, que inaugurou a divergência a favor do setor rural, afirmou que no ano de 2010, “ é possível observar que o volume de recursos retirados do setor sob a forma de tributos federais (R$ 21,2 bilhões) excede substancialmente o volume de recursos gastos pela União com o setor (R$ 14,7 bilhões)“. Na sequência, explicou que “não se concebe ‘técnica legislativa’ que permita o ‘aproveitamento’ das alíquotas e bases de cálculo de contribuição social com inconstitucionalidade reconhecida“, bem como que “deve-se declarar inconstitucional o artigo 30, IV, da Lei 8.212/91, (…) porque a dogmática fiscal não permite a imputação de responsabilidade tributária a terceiros pelo pagamento de tributo manifestamente inconstitucional“.
No dia 31/05/2020, foi publicada a suspensão do julgamento para aguardar o voto do Min. Dias Toffoli.
Por fim, é provável que a parte vencida embargue a decisão para obter modulação dos efeitos, isto é, para que a decisão tenha validade apenas no futuro.
Texto atualizado em 09/11/2023.
Por Daniel Andrade Pinto.
Daniel Andrade Pinto é advogado na Andrade Pinto Advocacia Tributária, mestre em Direito Constitucional pela ITE de Bauru-SP, especialista em Justiça Constitucional pela Universidade de Pisa na Itália, diretor e editor do Tributo – Núcleo de Tributação.